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Mostrando postagens de agosto, 2016

Festa de boas vindas

Às quatro e trinta da manhã Seu Constantino já estava de pé, arrastando os chinelos no assoalho de madeira e indo de um lado pro outro, como seus pensamentos. Seus dentes estavam num copo d’água, e por isso ele não roia as unhas. Não era tanto nervosismo o que ele sentia, mas uma estranheza, como um viajante que acorda num quarto diferente. Neste caso era verdade, pois estava depositado no asilo como uma economia de família, um valor esquecido num banco de gente. Na noite anterior o enfermeiro havia explicado que os residentes gostam de preparar uma festa de boas-vindas para os novatos. Seu Constantino odiava festas de velhos. A única diferença entre sentar-se sozinho no quarto, ele pensava, era que na festa toda aquela gente velha se reunia num mesmo cômodo, mas estavam sozinhos. Era constrangedor. A experiência de oitenta e sete anos lhe ensinou que nessas ocasiões, a maioria ficava calada, parada, dormindo. Às vezes alguém colocava um Cauby Peixoto “pra dar uma animada”. Não f

Coadjuvantes

Juliano passa pelo caixa e paga pelas balas e pelo Dramin. Daqui eu não consigo ver o rosto dele, nem o da moça atrás da registradora. O ônibus tá tremendo e não dá pra ouvir as vozes deles também. Esfrego meus olhos e arrasto o corpo na poltrona que cheira a cigarro. Estou me sentindo amarrotado e fecho meus olhos. Estou empacotado pra outra cidade e só sei que dormi por que a saliva que escorreu pelo meu queixo deixou minha barba gelada, no cantinho da boca. Nem vi meu irmão se levantar e descer na parada. Nem o vi voltar e se sentar na poltrona ao meu lado. Eu odeio viajar de ônibus. Ainda mais quando é pra esse tipo de ocasião, um enterro. O ônibus balança e me sinto mais acordado, na direção de uma despedida. Foi o Juliano que me falou: “Arruma uma mala que vamos ter que viajar. A prima morreu.” Ha onze horas ele falou isso e agora está calmo do meu lado, ouvindo algum reggae nos fones de ouvido e batucando nas coxas. Não é como se eu me importasse, também. Sei lá. Eu go